Em mais um capítulo da controversa ação penal que acusa o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados de tentarem um “golpe de Estado” após as eleições de 2022, o deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem (PL-RJ), prestou depoimento nesta segunda-feira (10) na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF).
O interrogatório, conduzido pelos ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux, e pelo procurador-geral da República, Paulo Gonet, durou menos de duas horas. Ramagem foi o segundo a depor — o primeiro foi o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, que firmou acordo de delação premiada com a Polícia Federal.
Durante sua fala, Ramagem criticou duramente a condução da investigação pela Polícia Federal, acusando o órgão de ter “induzido ao erro” tanto a Procuradoria-Geral da República quanto o próprio Supremo Tribunal Federal. Segundo ele, as acusações são “fantasiosas” e baseadas em interpretações distorcidas de documentos e mensagens.
“Esses documentos sobre supostas fraudes nas urnas são apenas anotações privadas, sem valor oficial. Nunca determinei qualquer ação da Abin nesse sentido. É uma ilação absurda”, afirmou o parlamentar.
Ramagem também foi enfático ao negar que tenha usado a estrutura da Abin para vigiar autoridades públicas, incluindo ministros do STF. “Nunca houve arapongagem. O que estão tentando construir é uma narrativa para criminalizar adversários políticos do atual governo”, disse.
Questionado por Luiz Fux sobre a possibilidade de haver agentes da Abin agindo de forma independente, Ramagem respondeu que o órgão sempre operou dentro dos limites legais e sob controle institucional. “Não há ‘arapongas autônomos’. Isso é um enredo típico de ficção política.”
Além de Moraes e Fux, apenas o advogado de defesa de Ramagem fez questionamentos. Os defensores dos demais réus optaram por não interrogar o deputado.
Processo polêmico e clima de perseguição
A ação penal 2.668, que acusa Ramagem e outras sete figuras de alto escalão do governo Bolsonaro — incluindo o próprio ex-presidente — de crimes como tentativa de golpe, formação de organização criminosa e dano ao patrimônio público, tem sido alvo de críticas por parte de juristas e parlamentares que enxergam no processo um viés político e punitivo, especialmente diante da atuação centralizadora de Alexandre de Moraes.
“Não estamos diante de um julgamento técnico, mas sim de um espetáculo político-midiático que visa desmoralizar a direita e silenciar vozes conservadoras no país”, declarou um deputado governista ouvido reservadamente pela reportagem.
Agenda e próximos depoimentos
O cronograma segue nesta terça-feira (11), com o interrogatório do almirante Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha. Ainda esta semana, prestarão depoimento outras figuras do governo Bolsonaro, como o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o general Augusto Heleno, o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira, e o general Braga Netto, que será ouvido por videoconferência devido à sua prisão no Rio de Janeiro.
O próprio Bolsonaro será ouvido ao longo da semana. A defesa do ex-presidente tentou adiar a audiência alegando falta de acesso a provas e a necessidade de ouvir testemunhas antes de seu interrogatório, mas o pedido foi rejeitado por Moraes.
A audiência ocorre sob um clima de forte polarização, com a base bolsonarista denunciando o que considera ser um processo de perseguição judicial sem precedentes. A expectativa é que os interrogatórios tragam à tona novas evidências — ou contradições — que possam fragilizar a versão oficial da acusação.