Todas as semanas nossa imprensa denuncia a “caixa preta” do Proinc (Programa de Inclusão Profissional) da prefeitura de Campo Grande.
O noticiário gira em torno do pedido oficial do vereador André Luís Soares(Rede) ao Executivo sobre os números do Programa.
A prefeitura tem negado dar estas informações, alegando que a legislação (principalmente a eleitoral) proíbe que elas sejam disponibilizadas em função do sigilo que impõe o direito à privacidade. Uma briga judicia inócua.
O grande problema é saber qual a razão pelo qual um programa de benefícios sociais, que diz atender milhares de pessoas, ganhou tamanha má fama.
O Proinc virou hoje um valhacouto da picaretagem municipal. Alguém poderia alegar que em época de eleição é assim mesmo: adversários políticos sempre inventam coisas para desgastar quem está no poder. Só que histórias nebulosas em torno do Proinc vêm de anos.
O Proinc foi criado em 2010 pelo prefeito Nelsinho Trad, na esteira de iniciativas que se tornaram moda naquele período. Todos queriam dar oportunidade para parcela excluída da sociedade.
A ideia foi a de garantir um salário mínimo, cursos técnicos, cesta básica, passe de ônibus e outros benefícios para quem não tinha como se inserir no mercado de trabalho.
Tudo isso pelo prazo máximo de 2 anos, mas hoje há propostas de ampliar para 4 anos – e tem vereador defendendo que o benefício possa perdurar por dez anos, pagando 13º salário, indenização por morte e invalidez, além de acumular 8% de recursos dos salários pagos num fundo de reserva a ser devolvido quando o cidadão se desligar do programa.
Teoricamente, uma lindeza; financeiramente, não há estudos de viabilidade ou sustentabilidade. Além disso, como o Proinc não tem um sistema de fiscalização adequado, as regras não são passíveis de aferição rigorosa. Um prato cheio para populistas do tipo Bernal e Marquinhos Trad.
O primeiro gestor que tentou dar um freio de arrumação no Proinc foi o ex-diretor da Funsat, Claiton Neves, que assumiu em 2017, e passou a fazer um controle nas ocupações de vagas do Proinc.
Quando, na gestão Marquinhos, ele percebeu que a tendência era a contratação clientelista, sem critérios, na melhor tradição patrimonialista, passou a reclamar nas reuniões do secretariado.
Pedia que parassem de enviar pessoas à galega para serem absorvidas pelo programa. Até que um dia, num acesso de raiva, falou em alto e bom som que não iria colocar dentro do Proinc “menininhas de programa”. Ali começou a bagunça.
Depois de dois ou três meses ele foi exonerado e passou a trabalhar no Gabinete do Prefeito, com a responsabilidade de gerar emprego durante a pandemia. (Perceberam a ironia?).
Luciano é uma boa alma. Ele acredita piamente (não riam, por favor) em Marquinhos Trad. Diz que demonizar o Proinc é retrocesso. Pergunto quantos beneficiados estão no Programa. Ele responde que precisa verificar o relatório atualizado. Pergunto sobre o volume de recursos gastos mensalmente no Proinc, somando todas as despesas diretas e indiretas. Ele responde que não tem o número na cabeça, naquela hora.
Respiro fundo. Faço um breve momento de silêncio e questiono se ele tem conhecimento de que a fama do Proinc é péssima e que há denúncias de exploração sexual por parte de participantes do programa, cujos relatos diziam haver “moças” servindo a cúpula do poder na prefeitura, além do fato de que a grande maioria dos “trabalhadores” ali alocados estava nas ruas fazendo o trabalho de cabos eleitorais para o ex-prefeito.
Luciano diz que essas denúncias são vazias, fruto do jogo político. Pergunto se há um sistema de controle para verificar essas denúncias. Ele diz que não, que seu trabalho é apenas formalizar o processo de contratação dos beneficiários. Os controles ficam a cargo dos secretários municipais.
Complicado. No fim, chego à seguinte conclusão: um programa social muito afrouxado e que permite a difusão de desconfianças gerais em torno de seus propósitos, tem tudo para gerar sua autodestruição, com imensos prejuízos àqueles que são mais vulneráveis. O Ministério Público Estadual devia olhar esse assunto com mais cuidado. A leniência de hoje produzirá monstros no futuro.
Volto ao assunto.
Artigo publicado originalmente no jornal O Estado de Mato Grosso do Sul e Blog do Dante Filho